Haviam umas botas. Que botas! Um par de botas que mereceria uma exposição exclusiva para si...Só não mereceu por não receber apoio do Ministério da Cultura. Porém convenhamos, há botas e botas. Algumas delas são extraordinárias. Qualquer destemida que calçá-la, estará pronta. Pronta pra tudo. Os pés, que nesse tipo de sola se aconchegam, estarão prestes a encarar algo novo. Até porque, inacreditáveis, são as botas. E inacreditável será aquela que dentro dela estará enraizada. Podia haver um ditado, se é que já não há, que cite: “diga-me o que calças, que te direi quem és”. Na verdade já existe um parecido.
Mas voltando as botas, elas diziam, e muito, sobre aquela criatura. Era uma bota enegrecida, assim como ela. Uma bota reluzente, assim como ela. E acima de tudo, a bota era roliça e torneada, assim como ela. Deve ter custado caro aquilo. Provavelmente lhe foi comprada por um de seus "súditos”.
O cano, da bota, era justo, calçado à vácuo. Se firmava na parte mais polpuda da panturrilha. Apertava de modo que o cano não escorregasse e também permitia que naquela panturrilha, pulsasse o sangue. E pulsava, com fervor. O cano era firme. E isso era bom.
Findando o cano, permanecia o cerne, o conteúdo, que assim como nos livros, é o que interessa, normalmente. Aquela tez lisa e curvilínea dava segmento a lisura e curvatura do cano, da bota. Quanta pressão. E a pressão seguia. Curva pra cima, curva pra baixo, intersecção. Todas fechadas, não havia naquele território, sequer, uma reta. E essa quantidade de curvas era coberta por um longo e espesso sobretudo. Aquele casacão, sobretudo, escondia o jogo e criava aflição em todos. Era impossível saber que tantas curvas se curvavam por debaixo daquela estupidez de casaco, sobretudo.
Mas o que realmente importa dessa história toda, não é a bota ou o cano. E nem o sobretudo, sobretudo.
É sim, a personalidade que aquele calçado trazia. Tenho absoluta certeza de que qualquer pessoa da face da Terra conseguiria descrever e entender de quem estávamos tratando. De qual moçoila teria a ousadia de comprar e principalmente, calçar seus pés 35/36 dentro daquela ofensa de calçado.
Com apenas uma parte daquilo que lhe vestia, já conseguiríamos descobrir de quem se tratava em questão. Em um close, em um fato.
E assim é Pato, Abbondanzieri. Há quem diga que sua contratação pelo Internacional foi errônea, por ser um goleiro velho, em fase decadente. Mas mesmo o Inter levando sufoco do medíocre Deportivo Quito, Pato mostrou porque é tão respeitado lá fora. Além das defesas, assim que percebeu o grave erro do árbitro no pênalti marcado, partiu pra cima do auxiliar, como todo bom argentino. Conseguiu fazer com que o árbitro voltasse atrás, humildemente. Se dependêssemos de Lauro, veríamos uma cara de injustiça e um gol a mais no score do adversário. Mas menos mal, que o Inter teve audácia e ousadia: comprou para si a bota da imponência, a bota da personalidade, que em um lance, justifica seu valor.